O que me vai na alma...

sábado, 19 de abril de 2008

Da origem...


"Outros que não eu teriam falado de “raízes”... Não emprego esse vocabulário. Não gosto de raízes e da imagem ainda menos. As raízes enfiam-se na terra, contorcem-se na lama, crescem nas trevas, mantêm a árvore cativa desde o seu nascimento e alimentam-na graças a uma chantagem. “Se te libertas, morres!” As árvores têm de se resignar, precisam das suas raízes; os homens não. Respiramos a luz, cobiçamos o céu e quando nos metemos na terra é para apodrecer. A seiva do solo não nos sobe pelos pés em direcção à cabeça, os pés só nos servem para andar. Para nós, só as estradas contam. São elas que nos guiam – da pobreza à riqueza ou a outra pobreza, da servidão à liberdade ou à morte violenta. Elas fazem-nos promessas, levam-nos, empurram-nos e depois abandonam-nos. E então morremos, tal como nascemos, à beira de uma estrada que não escolhemos. (…) Ao contrário das árvores, as estradas não surgem da terra, ao acaso das sementes. Tal como nós, têm uma origem. Origem ilusória, já que uma estrada nunca tem um verdadeiro começo; antes da primeira curva, lá para trás, já havia outra curva e ainda outra. Origem inatingível, pois que a cada encruzilhada se juntam outras estradas, que vêm de outras origens. Se tivéssemos que contar todas estas estradas confluentes, daríamos cem vezes a volta à Terra."

[Amin Maalouf, Origens]

4 comentários:

Anónimo disse...

Está curioso este texto sobre as origens.
Realmente, a nossa vida parece um percurso errático através de uma estrada que parede não ter fim... mas que, um dia, acaba.
Vamos andando ao longo dela, sempre ávidos de ver o que vem depois, guardando na nossa memória o que passou.
Às vezes, a estrada faz um cotovelo e passamos ao lado de algo que já vimos. Mas só passamos ao lado! Nada volta.
Faz-me pensar naquelas imagens de filmes americanos, em que as personagens erram por estradas pousadas no meio de nenhures, que parecem não vir de lado nenhum, nem ir para lado nenhum. Estão só ali, para que alguém as percorra!

Just me disse...

Nós pertencemos a lado nenhum, e a nossa única origem certa é a nossa mãe ^^
Lá continuamos por estradas, até que o nosso caminho cegue ao fim, e que outros o continuem =)

Rui disse...

A vida é uma estrada, mas se não assentamos razies podemos passar uma vida inteira a vaguear sem ver/ter um destino.
Por muito que essa estrada seja bonita, é sempre bom saber que se tem uma estalagem para descansar...

Nikita disse...

Isso é verdade, RUI, a metáfora do caminho para a vida é muito boa, desde que haja sempre uma estalagem sossegada, harmoniosa, acolhedora para descansar... (eu não sou lá grande adepta de tendas de campismo)
Mas raízes?! As raízes tolhem-nos a liberdade, limitam-nos a mobilidade, prendem-nos, e se nos desenraizarmos, podem matar :(